segunda-feira, 23 de abril de 2012

NÃO foi no GRITO - 036



O PODER sem MEDIAÇÕES e o
PODER ORIGINÁRIO.

Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”      
                               Parágrafo único do Artigo 1º da Constituição de 1988.


Helios SEELINGER (1878-1965) - Pelo Rio Grande Pelo Brasil in Revista Máscara jun.1925
Fig. 01 –  A Primeira Republica Brasileira mostrava profundas contradições ao longo da década de 1920. Negando as práticas de mediação imperiais atadas aos pés do tono imperial buscou meios legais para que o PODER ORIGINÀRIO pudesse fluir o mais livre possível. Porém as longas tradições do cacicado, coronelismo e da escravidão de alma e de corpo tiveram os interpretes que impunham práticas de mediação e consequente submissão as mais absolutas. Os integrantes da Semana de Arte Moderna de São Paulo, os 18 do FORTE de COPACABANA e a COLUNA PRESTES, como os jagunços de Lampião tentaram forma estéticas, militares e populares que tentavam desmontar as antigas  estruturas de mediação de poder político brasileiro de todos os tempos. O artista Helios SEELINGER(1878-1965) interpretou em grande tela esta busca do poder direto.
A experiência direta constitui um tipo de realidade.  Outra realidade - completamente diferente - é esta mesma experiência como um evento mediado.
 A experiência direta é a percepção humana dos fatos das circunstâncias primárias até a passagem do tempo. As mídias eletrônicas, industriais, ou mesmo artesanais, captam este fato primário, se apropriam dele e o manipulam conforme seus interesses e projetos.  Depois é distribuído na forma de um produto adequado aos sistemas controlados, pagos e vigiados e pré-existentes ao fato primário. A indústria da mediação é uma das mais prósperas do século XXI. Diante do evento mediado, como outra realidade artificial e construída, Herbert Marshall Mcluhan (1911-1980) enunciou que “o meio é a mensagem”. Enquanto isto a experiência direta é um fato cada vez mais raro. E se esta experiência direta acontece, ela não é percebida como tal.

HANS STATEN1525-1579 cerimônia
Fig. 02 –  No mundo primitivo dos ameríndios o poder era atributo dos caciques que recebiam as variadas manifestações de subordinação. Este hábito de mediação e heteronímia projeta-se nas mentalidades e comportamentos de toda política brasileira. Estas mentalidades e comportamentos foram  reforçados com as figuras dos coronéis, senhores de engenhos e capitães de indústrias. Se os caciques temiam e respeitavam os seus pajés e curandeiros, estes vieram transfigurar-se em guias espirituais e aqueles da saúde. O círculo da mediação do. Poder que se amplia na medida da complexidade das civilizações e consome mais energias mentais e físicas,  conforme a tese Joseph Tainter das relações entre ENERGIA – DESENVOLVIMENTO – COMPLEXIDADE


A verdade é que os sentidos são instrumentos de mediações entre o ENTE humano e as formas de seu SER no mundo. Este SER da criatura humana no mundo experimenta as mais variadas mediações ao longo de sua existência. Desde a infância ela é introduzida no mundo pela mediação. Liberta-se da mediação paterna ao longo da adolescência para cair em outras variadas e subliminares mediações. Evidentemente que esta criatura humana está na busca do pertencimento a um grupo de iguais em idade,  trabalho em comum e no lazer coletivo. As mediações na política, na saúde, educação, cultura, comércio, religião são constantes ao longo da vida adulta. Raros e pontuais as experiências não mediadas. 

Uma sessão na CAPELA POSITIVISTA de PORTO ALEGRE no século XXI
Fig. 03 –  Há de se distinguir o COMTISMO do POSITIVISMO. As doutrinas de Augusto Comte (1798-1857) foram apropriadas e mediadas pelos POSITIVISTAS e que as transformaram em instrumentos políticos. Esta distinção já havia sido realizada por Olinto de Oliveira (1866-1956) em 1897. Como uma dos fundadores da Faculdade de Medicina esta contrariando os POSITIVISTAS ortodoxos quem as profissões eram livres e desimpedidas de qualquer mediação– A distinção também pode ser realizado entre MARXISMO e COMUNISMO.

Estes momentos de vazio e de liberdade do EU encontram patrulheiros sempre atentos no plantão da MORAL disposto a mediar esta possibilidade junto aos OUTROS. Patrulheiros, profissionais ou amadores, que se acham na obrigação de...mediar. Mediar preventivamente para que o vazio e a liberdade individual não derivem para o ócio, o vazio existencial e a inadiável necessidade da escravidão voluntária. Mediar a pretexto de desviar o EU do OUTRO da morbidez, da marginalidade ou da criminalidade.

Décio Villares (1851-1931) MOUNUMENTO à JÙLIO de CASTILHOS
Fig. 04 –  A longa tradição do cacicado, do coronelismo e da escravidão - de alma e de corpo-  teve em Júlio de Castilhos (186-1903) um dos interpretes que impunham práticas de mediação . Esta mediação corria para a submissão a mais absoluta ao Partido Republicano que conquistara o poder pelas armas, pela imprensa e pela ideologia do positivismo que se queria científico. A retórica e o conhecimento do direito formal reforçavam esta mediação e manipulação do. Poder que voltava ao centralismo ao modelo daquele do TRONO IMPERIAL.

Por surpreendente que possa parecer, o artigo 1º da Constituição Brasileira de 1988 contraria este patrulhamento ao abrir o exercício do poder a possibilidade da não mediação.
É possível ler Dos Princípios Fundamentais:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:
        I -  a soberania;
        II -  a cidadania;
        III -  a dignidade da pessoa humana;
        IV -  os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
        V -  o pluralismo político.
    Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (sublinhado pelo autor)
Cabe a evidente ressalva das competências e dos limites deste exercício do poder “nos termos desta Constituição”. Esta competência do “exercício direto do poder” é precedida pelos “termos da Constituição” que apontam para os pilares da cláusula pétrea dos cinco princípios fundamentais que caracterizam e fundamentam “todo o poder emana do povo”

O monumento a Júlio da Castilhos  e a Justiça Maximiliano FAYET (1930-2007)  
Fig. 05 –  A mediação política, praticada no Brasil,  encontra dificuldade num diálogo construtivo entre legislativo, executivo e judiciário no interior  da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O efeito imediato desta dificuldade é a clivagem entre a autoridade constituída e o PODER ORIGINÀRIO. Este  permanece surdo, mudo e cego devido aos estridentes  ruídos provenientes das três esferas do seu próprio governo

No presente texto não se trata da volta á Natureza e ao primitivo. Natureza e primitivo também podem constituir-se nos lares do ócio, do vazio existencial e da escravidão voluntária, senão da morbidez, da marginalidade ou da criminalidade.

José de  FRANCESCO (1889-1967) -  Ciranda -  1956
Fig. 06 – O PERTENCIMENTO ao grupo humano é, em principio, uma experiência direta, uma complementaridade e fortalecimento da segurança como necessidade básica individual. O problema inicia quando esta experiência degenera pela mediação incompetente para compreender por que “a arte não pode ter sua missão na cultura e formação, mas seu fim deve ser alguém mais elevado que sobre-passe a humanidade. Com isso deve satisfazer-se o artista. É o único inútil, no sentido mais temerário” conforme afirmou Nittzsche ( 2000, p.134 )

Também surpreendentemente a não mediação ganha pleno sentido na prática da arte. A autonomia exigida do artista só assim situa-se num plano para estar apta para receber a sanção pelas suas escolhas e suas perdas administradas. As técnicas e os materiais não bastam e não são suficientes para constituir uma obra de arte. Para tanto impõe-se ao artista dispor, no interior do seu projeto,  do direito de direcionar todo o potencial da sua vontade sensibilidade para a coerência final desta sua obra. Coerência na qual todo o seu ENTE está comprometido no seu SER artista.

Gilberto PEGORARO (1941-2007) -foto  trabalhando no atelier
Fig. 07 –  Ao artista não bastam as técnicas e os materiais e não são suficientes para constituir uma obra de arte. Para tanto o artista impõe-se a si mesmo dispor do direito de direcionar todo o potencial da sua vontade sensibilidade para a coerência final desta sua obra resulta do seu desenvolvimento no interior do seu projeto. Este projeto torna histórico o autor e a sua obra.

O fato  de a Arte não admitir a mediação, tem como reação a imediata resistência e as suas freqüentes e duras desqualificação que partem dos patrulheiros ideológicos e dos moralistas de plantão. Se nesta patrulhamento  a Arte não é coberta por pesado silencio ela é silenciada por ideológicos e pelos moralistas de plantão. Esta preocupação do seu isolamento ganhou, no final da cultura republicana romana, uma forma escrita na pena de Sêneca
Se prescindirmos de todo convívio, se renunciamos a todas as relações humanas e vivermos voltados exclusivamente para nós mesmos, esta solidão – desprovida de todo desejo – será seguida pela completa falta de ocupações significativas. Começaremos a construir prédios, a derrubar outros, a remover o mar, a conduzir as águas contrariando as dificuldades dos lugares e a gastar mal o tempo que a Natureza nos deu para gastar bem SÊNECA Da tranqüilidade do ânimo, p. 18
Porém o professor de Nero acerta em cheio quando fornece margem para que Arte autêntica seja “gastar bem o tempo que a Natureza nos deu”.  Este tempo que a Natureza nos deu é silenciado pela interferência da mediação. A mediação realiza, esta façanha de alienação,  por meio de factóides culturais. Factóides distribuídos e impostos por meio de uma larga e proveitosa indústria de entretenimento que não passa da mais pura mediação ou comprometer e corromper o TEMPO que a NATUREZA NOS DEU. O “pão e o circo” da política imperial romana era  uma política de mediação destinada a manter na heteronímia a massa crítica da multidão que acotovelava pelas estreitas ruas de Roma. 

João Batista MOTTINI (1923-1990)  - Vendedor de santos
Fig. 08 –  O comerciante da imagem acima realiza uma dupla mediação.. Faz circular tanto a arte como o tema religioso. Contudo, conforme esta imagem ele constitui-se num elo do sistema da indústria cultural. A linha de montagem da imprensa industrial necessita deste elo entre o produtor e o consumidor...  

Neste tipo de mediação a Arte entra como serva ou escrava pois nada delibera e decide ao modelo de uma boa, obediente e disponível escrava de luxo. Porém o poder imperial romano sabia que podia perder o controle apesar da política do “pão e o circo”. Para prevenir e reverter este perigo apelava, num esforço decisivo, para a pura e  estreita política da repressão e a mais cruel possível. Repressão por meio dos mais meios físicos criminosos, dolorosos, bárbaros. Expunha para a multidão os atingidos por esta repressão como espetáculo e como avisos exemplares de um poder invisível e invencível. Para os que queriam fugir, desta exemplar exposição pública, era permitida a graça do suicídio como foi concedido para Sêneca e para o seu aluno Nero.

Gastão TESCHE  - 1932-2005 - Janela noturna
Fig. 09 –   A janela media o espetáculo externo para o interior do lar ou do prédio. Esta mediação é interditada tanto para os atuais shopping’s center’s como para as igrejas da Propaganda da Fé. A experiência direta da Natureza deve ser anulada e interdita tanto no mercantilismo como na religião. A falta de janelas condicionam os cinco sentidos humanos para estarem a mercê  inteira das mensagens religiosas ou que os produtos não tenham concorrente algum. A janela é um índice  do jogo do poder que evidencia o grau de  mediação que o sistema permite ao seu usuário

Um Estado previdente sabe propor, implementar e usar os projetos civilizatório compensatórios da pura e  estreita política da repressão. Esta repressão faz parte de qualquer governo que realiza o contrato com o seu poder originário.  O ENTE público pratica a violência que o indivíduo isolado não pratica e que ele delega ao seu governo. Neste caso todo o aparelho jurídico está disposto para manter este contrato nos limites de suas competências. Porém vale o aviso de que “a corrupção dos ótimos é péssima” como avisavam os latinos. O aviso vale para os dois lados do contrato.

PELOTAS - Museu da Baronesa – estátuas de fachada
Fig. 10 –  O espetáculo da ostentação residencial foi inteiramente vedado ao súdito ao longo do período colonial brasileiro. Com a soberania brasileira esta ostentação adotou o Neo-Clássico francês de moda na época. .Com o regime republicano renovou-se com o eclético Art-Nouveau que durou até a Iª Guerra Mundial. Restam os vestígios deste poder econômico e a perspectiva da mediação por meio da indústria cultural do turismo..  

O estudante de arte ainda não faz arte, pois está em plena heteronímia dos seus mestres, dos regulamentos e das instituições formadoras ou mediadoras do seu agir, deliberar e decidir. Contudo, esta mediação e este estágio de heteronímia são de extrema importância para ele na medida em que lhe permitem dar-se conta e buscar vontade suficiente para alimentar projetos para se situar fora destas mediações.

STEINER Heins Rolf 1910-1974 - Mata Pau - 1945 - Gravura 38.5 x 18.4 cm
Fig. 11 –  Esta gravura mostra a realidade da complementaridade ou o parasitismo da  mediação no mundo vegetal. –Transpondo esta gravura ao mundo humano, como metáfora, podemos associá-la a tese Joseph Tainter das relações entre ENERGIA – DESENVOLVIMENTO – COMPLEXIDADE.ou as relações entre energia é dinheiro ou tributos num sistema capitalista e monetarista. A questão é até que ponto o PODER ORIGINÀRIO percebe que estes tributos não são um simples parasitismo e em que medida ele entende, concorda e  pode pagar sempre mais tributos


A automedicação– sem a mediação do profissional da Medicina – constitui um dos grandes riscos da saúde e deriva para a charlatanice se esta prática for socializada. De outra parte não há médico honesto que não reconheça que a cura de um paciente depende deste doente. Ao profissional da saúde compete fornecer os meios adequados para que o doente possa empreender o caminho para gozar a fortuna da cura e da sua plena saúde. Neste caso evidenciam as competências do sujeito da cura e o mediado deste processo.

Décio Villares (1851-1931) MAQUETE do MOUNUMENTO à JÙLIO de CASTILHOS
Fig. 12 –  A construção intencional dos símbolos nacionais, além das leis, é um processo que alguns denominam de “fabricação” . Esta “fabricação” constitui a mais tradicional forma de mediação entre o  poder do Estado e o  Poder do qual este poder estatal pretende ser Originário. Em geral esta “fabricação” ultrapassa a PUBLICIDADE e nada tem a ver com ela.. Na realidade avança em direção à mais pura PROPAGANDA e MARKETING pelo qual um regime tenta se legitimar fisicamente e assim marcar o seu território de PODER.contra potenciais concorrentes que poderiam exercer diretamente este poder que julgam estar em suas mãos e sob o alto controle.dos seus próprios interesses particulares..

No plano político esta vontade possui origem e interesse governamental. Para tanto basta ler Platão, (1985,p.84) como
Cada governo estabelece as leis para a sua própria vantagem: a democracia leis democráticas, a tirania leis tirânicas e os outros procedem do mesmo modo; estabelecidas estas leis, declaram justa, para os governados, esta vantagem própria e punem quem transgride como violador da lei e culpado de injustiça

O termo POVO já constitui um mecanismo para  escamotear e ocultar a verdade de que a corrupção dos ótimos é péssima. Acusa-se a TODOS e ao mesmo tempo a NINGUÉM. Esta abstração não possui rosto, autonomia ou vontade própria. Isto confere o prêmio de não ser responsabilizada ou criminalizada pelos piores atos que este coletivo cego vier a cometer. A este conjunto costuma-se denominar povo, maioria, multidão ou simplesmente “OS OUTROS”. Voltaire, um dos representes do Iluminismo francês, já observava: “se fosse necessário escolher detestaria menos a tirania de um só do que a de muitos. Um déspota tem sempre alguns bons momentos; uma assembleia de déspotas nunca os tem”. Este prognóstico veio se confirma ao longo da Revolução Francesa, especialmente nos momentos de “Sono da Razão” como verificou o desiludido pintor Francisco Goya.

RAPHAEL BORDALO PINHEIRO 1850- 1910  Revista Berlinda  1872  Guia de conversação Brasil Portuga
Fig. 13 –  A caricatura vale-se com freqüência da sátira contra a mediação– como esta do Imperador Dom Pedro II numa viagem a Portugal busca um guia para mediar a conversação entre brasileiros e lusitanos e  vice-versa.  Com certeza uma língua é uma experiência direta e que se encontra fora do código e e repertório de uma outra cultura necessita esta mediação.. O pensamento humano necessita deste suporte e nas artes visuais esta mediação foi percebida quando escreveu que “a palavra dirige o olhar”.

Muitas formas de governo como também sistemas políticos e comerciais escondem se atrás da fachada dos OUTROS transformados “numa assembleia de déspotas”. Os mentores das assembleia de déspotas necessitam da obediência cega destas multidões. Com este objetivo “da obediência cega das multidões ou dos OUTROS”,  tornam-se mestres nos expedientes de promover a técnica dos eventos e espetáculos que possuem o escopo de escamotear “a corrupção dos ótimos é péssima”. Um dos expedientes desta corrupção é soltar os mais baixos instintos das multidões ou dos OUTROS e, depois, apontar alguém responsável pelo que estas multidões  acabaram de praticar. 

George Wesley BELLOW (1882-1925)  Bot Member of This Club - 1909
Fig. 14 –  Nas lutas encenadas de box o poder comercial media o espetáculo publico com a idéia de que o fracasso é uma questão pessoal que não pode ser atribuido ao  sistema  no qual ele se encontra. A montagem "é falsa", e ninguém  acredita realmente nestes lutadores de araque.  A ilusão é perfeita. O espectador acredita sem acreditar e, nesta contradição,  mergulha,  de corpo e de alma,  numa cultura que confunde tudo aquilo que é  genuíno.

O escritor norte-americano Chris Hedges, mostra no seu livro “O declinio moral da América”  o confonto entre o bem e o mal  montado como espetáculo para a multidões e praticada entre boxeadores norte-americanos. O autor mostra como são conduzidas as formas de mediação nestes lutas e o papel da credulidade popular. Contudo é necessário que o show  continue a funcionar numa série interminável. As mediações possuem como objetivo mostrar ao  espectador o triunfo da vontade. Ao longo e a final as multidões sejam induzidas a concluir e reforçar  a idéia de que o fracasso é uma questão pessoal que não pode ser atribuido ao  sistema  no qual ele se encontra. Evidente que toda esta montagem "é falsa", e ninguém  acredita realmente nestes lutadores de araque.  A ilusão é perfeita. O espectador acredita sem acreditar e, nesta contradição,  mergulha,  de corpo e de alma,  numa cultura que confunde tudo aquilo que é  genuíno. Esta cultura aprendeu que as arenas romanas sempre estiveram lotadas de hordas de bárbaros ululantes, multidões sedentas de sangue e de emoções fortes. Interessa reunir e manter a atenção destas multidões que para estes promotores não passam de meros números.  Nestas multidões o governo, os sistemas culturais, políticos e comerciais vão pescar o seu proveito proprio.

Gravura de Ernest ZEUNER (1890-1967) - Supermercado - Revista do Ensino 25.4 x 36.5 cm
Fig. 15 –  O poder econômico e comercial encontrou formas para escamotear a mediação– e onde se descobre tarde que o produtos mais vistosos e baratos resultam de sistemas de trabalho escravo em países periféricos Contudo super-mercados , shoppings center-s como as igrejas barrocas não possuem janelas das quais se possa vislumbrar a paisagem. A semelhança dos templos da Propaganda da Fé que desenvolvia recursos para capturar e prender os cinco sentidos humanos, assim shoppings Center captam e prendem os cinco sentido humanos enquanto a mente é bombardeada pelo Propaganda e marketing.

Afinal a norma geral desta corrupção dos ótimos é péssima. vai pela cartilha silenciosa - e nunca escrita - do “socializar todos os prejuizos e embolsar os lucros em proveito individual e pontual do mais mais forte e do mais oportunista”. O evento mediado cria uma realidade completamente diferente da experiência direta e controlada pelo cidadão. Mas afinal a indústria da mediação é uma das mais prósperas do século XXI e este espetáculo não pode parar diante de uma simples experiência direta e controlada pelo cidadão.
Este cidadão potencialmente pode se socorrer e amparar nos pilares dos cinco princípios fundamentais constitucionais brasileiros  que caracterizam e fundamentam “todo o poder emana do povo”. Resta saber o grau de conhecimento, de vontade e dos limites e das competências deste DIREITO à NÃO MEDIAÇÃO que ele delibera e decide colocar diretamente no mundo. Conhecimento e vontade de exercer também o direito de se indispor, contrapor e de contrariar o hábito e a cultura indireta geral, praticada descaradamente por meio da socialização do prejuízo e da apropriação individual do lucro.
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FONTES do PRESENTE TEXTO

HANS STADEN (1525-1579)

A TIRANIA em VOLTAIRE : François Marie AROUET (1694-1778)
NIETZSCHE, Frederico Guillermo(1844-1900)Sobre el porvenir de nuestras escuelas. Barcelona:Tusquets,2000. 79 p.      

Chris Hedges. DECLINIO AMERICANO e a MEDIAÇÃO

PLATÃO ( 427-347) – A REPÚBLICA – Tradução di J. Guinsburg  1º volume . São Paulo : Difusão Européia do Livro, - 1985 - 238 p.    http://pt.scribd.com/doc/36631268/A-Republica-Platao-Vol-I
------: COTEXTO do PENSAMENTO
----- TIRANIAS

Joseph Tainter e a tese da relações entre ENERGIA – DESENVOLVIMENTO – COMPLEXIDADE

A presente postagem possui objetivos puramente didáticos
1º  blog :

segunda-feira, 16 de abril de 2012

NÃO foi no GRITO - 035



O BRASIL em ABRIL de 1812 no CORREIO BRAZILIENSE
Uma PRINCESA  SONHA em COMANDAR, a PARTIR do RIO de JANEIRO, o MUNDO IBÉRICO e as suas COLÔNIAS. 


Fig. 01 –  Infanta Carlota Joaquina da Espanha e Princesa do Brasil (1775-1830) – Gravura
A presente postagem irá examinar a distância do PODER ORIGINÁRIO do GOVERNO de SUA NAÇÃO ao colocar a questão de DONA CARLOTA como candidata à Coroa Espanhola. Distância que se fará abismal por meio da teia continental que as coroas européias impunham para preservar os seus interesses hereditários depois dos golpes fatais da guilhotina francesa. Distância de SUA NAÇÃO que estas coroas diziam e faziam crer estarem ainda representando à revelia do PODER ORIGINÁRIO do seu GOVERNO.



Fig. 02 –  Corte de CARLOS IV  da Espanha  (1748-1819) – Pintura 1801 de Francisco Goya (1746-1828)

Existe a categoria daqueles que ocupam cargos, mas nada sabem, ou querem saber, das funções atinentes a este cargo. Será apenas mais um entre muitos outros parasitos passivos, com que um Estado necessita saber lidar. O “porém”, é que este parasito passivo pode perpetuar-se e deixar descendentes. Contudo existe uma categoria, mil vezes pior, que é formada por aqueles que ocupam um determinado cargo, legalmente existente. No entanto, uma vez legalmente instalados, nestes cargos, começam a inventar funções, rituais e extensões de competências absolutamente além dos limites deste cargo. Este cargo passa a ser um trampolim para objetivos alheios ao bem comum que se reduzem ao bem do próprio ocupante do cargo e ao dos seus comparsas. Esta corrupção provoca as maiores catástrofes no presente e no futuro e se constitui num eixo ativo do mal coletivo. Nesta catástrofe o trágico convive com o ridículo e que se reforçam ativa e reciprocamente.


Fig. 03 –  Detalhe da corte de CARLOS IV  da Espanha  (1748-1819) – Pintura 1801 de Francisco Goya (1746-1828) com destaque Infanta Carlota Joaquina da Espanha e Princesa do Brasil (1775-1830)

A imagem da FAMÍLIA de CARLOS IV da Espanha se encaixa entre este trágico e este ridículo. Estas figuras foram captadas magistralmente e representados por Francisco Goya. O trágico eram as forças da Revolução Francesa que podiam surgir a qualquer momento no território - do qual se diziam reis -  trazendo a guilhotina com a qual eliminaram as cabeças coroadas da França. O ridículo surgia com  uma casa real, com o mínimo de conexões e interações com o seu Poder Originário que havia abandonado esta casa real à sua própria sorte. Nesta imagem  aparece a figura de Dona Carlota Joaquina que agora estava sendo cogitada - pelas cortes espanholas de Cádiz - para soberana desta Espanha ocupada pelos franceses e campo de manobras e batalhas dos exércitos aliados sob o comando da Inglaterra. O pintor, sem formação acadêmica, mas profundamente influenciado pela propaganda iluminista, enfrentava-se com a mentalidade com o que de mais retrogrado e reacionário de uma corte medieval. Reação potencializada e no sentido contrário da Revolução Francesa que havia guilhotinado os vizinhos reis franceses. O quadro é dos autênticos e terríveis documentos desta perplexidade do pintor colocado entre um passado irremediavelmente irracional e perdido e diante de um futuro no qual soava a marcha dos soldados napoleônicos.
Para o leitor do Correio Braziliense -  de nº 047 de abril de 1812 na p. 417/8 - o decreto das cortes espanholas de Cádiz deveria soar entre o ridículo, o deboche e a tragédia. O texto deste decreto dava-lhe, porém,  a certeza que este tema não era um factóide de uma oposição ensandecida muito menos um sonho.  


Fig. 04 –  Personagens  da corte de CARLOS IV  da Espanha  (1748-1819) – Pintura 1801 de Francisco Goya (1746-1828) com destaque dos nomes que podem ser associados aos nomes mencionados no decreto a segui
Clique sobre a imagem para ler os nomes
Decreto das Cortes de Hespanha sobre a suecessaõ á Coroa.
As Cortes Geraes e Extraordinárias, considerando, que o bem, e segurança do estado saõ imcompativeis com a concurrencia de circumstancias, nas pessoas do Infante D. Francisco de Paula, ds Infanta D. Maria Luiza Raynba viuva de Etruria, irmaõ e irmaã de D. Fernando VII.; tem resolvido declarar e decretar; que o Infante D. Francisco de Paula e seus descendentes, e a Infanta D. Maria Luiza e seus descendentes, ficam excluídos da successaõ á coroa de Hespanha. Em conseqüência, na falta do Infante D. Carlos Maria, e de seus legítimos descendentes, a Infanta D. Carlota Joaquina Princeza do Brazil, e seus legítimos descendentes, seraõ chamados á successaõ da coroa; e na falta de seus herdeiros, entaõ D. Maria Izabel, Princeza hereditária das Duas Sicilias; e seus legítimos descendentes; e na falta destes três parentes mais próximos de D. Fernando VII. e seus descendentes, entaõ succederão as outras pessoas e linhas, que devem succeder segundo a constituição, na ordem e forma, que está estabelecido. Ao mesmo tempo as Cortes declaram e decretam excluídos da suceessaõ à coroa de Hespanha, a Archiduqueza de Áustria D. Maria Luiza, filha de Francisco II. Imperador de Áustria, de seu primeiro casamento, assim como também os descendentes da dicta Archiduqueza.
Cadiz, 21 de Março, 1812.

O vendaval que assolava a Península Ibérica - e enquanto Napoleão Bonaparte preparava a sua desatinada invasão da Rússia - fazia acender especulações e mecanismos de fuga diante do espetáculo dantesco desta eminente catástrofe. A catástrofe russa na qual iriam mergulhar 600.000 vidas francesas e os seus aliados e de outras tantas vidas eslavas, nunca sendo contabilizadas as vítimas fatais de ambos os lados.


Fig. 05 –  INVASÂO FRANCESA de PORTUGAL . Esta imagem das tropas francesas entrando em Portugal  foi criada muito tempo depois do fato, mostra um exército Frances desordenado e destroçado. As forças de elite francesa estavam empenhadas em outras campanhas.
Contra esta potência - saída da Revolução e que guilhotinara o rei e rainha francesa - só uma união massiva e integrada da Península Ibérica. A pessoa que será escolhida para reconstruir simbolicamente era a Esposa do Príncipe Regente de Portugal, Algarves e Brasil e da casa real da Espanha. Contudo diante de todos os olhos estavam as multisseculares distinções e diferenças das duas nações. Distinções e diferenças consolidadas pelos mais variados tratados estabelecendo as nítidas divisões por meio de fronteiras sobre as quais já havia sido derramado muito sangue. De outra parte a maioria das Províncias e Vice-Reinos Espanhóis da America já estava em estado adiantado de sua soberania e distante de qualquer possibilidade de refluir para uma pretendida monarquia ao estilo do “Ancien Regime” e que o Iluminismo tinha despojado de todos os mitos, glórias e explicações transcendentes.
Este refluxo parecia certamente plausível e até elogiável para o redator do Correio Braziliense. Para ele, na medida em que percebia o “Commonwealt”  tomar forma e  corpo sob o comando da Coroa Britânica. No nº 047 publicava as suas reflexões na sessão Miscelânea  entre as páginas 554 e 556 sobre este decreto das cortes espanholas
“O decreto das cortes de Hespanha, que fôra discutido em uma sessão secreta; e depois promulgado em 21 de Março, na forma por que o damos em resumo a p. 417; chamaõ para a successaõ à corôa daquella monarchia a Senhora Princeza D. Carlota, logo depois do Infante D. Carlos Maria; e como este se acha prisioneiro em França, e naõ he mui de presumir que variem as circumstancias; que ali o detém, fica sendo altamente provável, que a Princeza, ou seu filho, o actual Principe da Beira, suba ao throno de Hespanha; e nesse caso se reúnem em uma pessoa as coroas de Hespanha e Portugal.


Fig. 06 –  Dom JOÃO VI – proclamado rei de PORTUGAL, ALGARVES e BRASIL, no Rio de Janeiro,  no dia 20 e março de 1816.
Esta uniaõ tem sido varias vezes meditada;  como em tempo de D. Affonso V de Portugal, o qual casou com a ao depois chamada Excellente Senhora, com o fim de herdar a coroa de Castella; em tempo de D. Manoel, que casou com a princeza D. Maria, primeira filha dos Reys catholicos Fernando e Izabel, de quem teve um filho o Príncipe D. Miguel; que morreo menino; e depois em tempo de Fellipe II.; que por sua má índole e tyrannia naõ pôde nem por força obter o fim de sua pretenção injusta:
Se èsta uniaõ se realizar agora, com a sabia medida que adoptáram as cortes de Hespanha; parecemos, que nenhum acontecimento político poderia ter mais útil, e interessante aos Portuguezes e Hespanhoes; porque a proximidade da linguagem, dos custumes, das leys, etc. faz com que Portugal se deva considerar uma parte integrante da Peninsula; e como neste supposto acontecimento fica salvo o orgulho nacional; porque os Portuguezes podem dizer que he um Príncipe seu quem vai governar Hespanha visto que a varonia he Portugueza; cessam os motivos de zelo, e descontentamento que alias sempre existiriam.
Deixando porem, no estado presente das cousas, a consideração das conseqüências de taõ feliz e desejável uniaõ para. as duas naçoens; vejamos a influencia desta disposição na politica, e systema de Governo da corte do Brazil; e ainda que naõ seja da nossa intenção entrar por agora mui profundamente na matéria, daremos com tudo a entender, de passagem, a necessidade que tem o Governo Portuguez de modificar certos princípios do systema actual que segue; se naõ deseja expor a naçaõ Portugueza, e a Hespahola; e o Governo que ha de vir a ser de ambas; a males, e perturbaçoens incalculáveis.



Gravura de Gustavo Doré
Fig. 07 –  DOM QUIXOTE e as suas TEORIAS CONSPIRATÓRIAS adquiridas em livros de cavalaria e vassalagens  medievais magistralmente reunidas na obra prima de Miguel Cervantes criavam o ridículo de um personagem completamente descolado da realidade mais objetiva e concreta. O escritor apanhava um traço universal do escapismo humano vivendo de um passado glorioso do qual nada sobrara a não ser narrativas que alguns usavam para justificar a sua insanidade mental. As cortes de Espanha e Portugal estavam vivendo este delírio em 1812.  Dona Carlota era cogitada para dar corpo a esta fantasia -

Mostramos ja em outro N°. que a Corte do Brazil tinha mandado prohibir que as gazetas, ou periódicos de Lisboa, fallassem nem a bem nem a mal nos prodecimentos das Cortes de Hespanha; e dissemos entaõ que naõ víamos que de tal medida pudesse resultar bem algum; antes sim mal para â literatura Portugueza. Eis se não quando apparece agora na Gazeta de Lisboa, este decreto das Cortes pelo qual se confere a coroa á Princeza de Portugal; e se publicou naqueila gazeta o decreto um pouco differente do que nos o damos i e alem disso em outra gazeta se publicou a solemnidade do juramento e publicaçaõ da Constituição da Monarchia Hespanhola. Ora isto posto ¿ ainda se naõ desenganaraõ os senhores do Governo no Brazil, que he impossível impedir que em Portugal se saiba, e se raciocine sobre o procedimento das Cortes de Hespanna ?


Fig. 08 –  GOYA Francisco - Desastres da Guerra -gravura 71 -  “Contra o bem geral”. O pintor do quando da FAMÍLIA REAL de CARLOS IV depois de assistir pessoalmente como alguns usam a sua insanidade mental para justificar seus atos, mostra, em suas gravuras antológicas, os efeitos destes desvarios e destes caprichos no mundo real e em especial o universo do PODER ORIGINÀRIO espanhol.  As cortes de Espanha e Portugal estavam vivendo este delírio, em 1812, e procuram arrastar para o meio de suas utopias o maior número de cúmplices destas loucuras. Um delas era Dona Carlota ser cogitada para dar corpo a esta fantasia. Goya, sem formação erudita, passou pela experiência pessoal de ter um pé e um olho nesta corte ensandecida e outro pé e olho voltado para o povo do qual provinha. As suas obras visuais são testemunhos desta dilacerante experiência pessoal e são preciosos documentos de época.

Vamos porém ao ponto principal. A Senhora Princeza, ou seu filho o Principe da Beira, subindo ao throno de Hespanha, deve Governar segundo a Constituição ; e por tanto ha de necessariamente attender á saudável e útil instituição das Cortes: os outros vassallos do mesmo Soberano, isto he os Portuguezes, haõ de obedeccr-lhe, sem tal vantagem de Cortes ; e unicamente sugeitos ao capricho, arbítrio, e intrigas de um ministro; ora ¿quanto tempo haõ de as duas naçoens Hespanhola e Portugueza viver socegadas, debaixo de um mesmo Soberano, estando ligadas a taõ diversa sorte ?  Negar que a Naçaõ Hespanhola tira vantagens de sua instituição de Cortes he negar uma verdade mais clara que a luz do dia; porque se não fosse o enthusiasmo que tem produzido em Hespanha o chamamento das Cortes, e a esperança de um governo regular, nunca teria acontecido a resistência que se tem feito aos Francezes; por que todos os Hespanhoes estaõ persuadidos, que naõ vale a pena de expor a vida a fim de se livrar do despotismo de Buonaparte, para se metter no despotismo de Godoy ; os Hespanhoes pelejam na bem fundada, e racionavel esperança de melhorar de sorte. Julgamos portanto, que o importantíssimo facto de chamarem as Cortes de Hespanha para a suceessaõ daquella monarchia a Senhora Princeza âo Brazil; ea natural conseqüência da uniaõ de ambas as coroas de Portugal e Hespanha na pessoa de S. A. R. o Principe da Beira, exige imperiosamente que os Ministros da Corte do Brazil, em voz de prohibir, que se publiquem em Portugal os procedimentos das Cortes de Hespanha, promovam a sua circulação; e além disso façam reviver os estabelicimentos em Portugal, que tanto se assimelham ás Cortes de Hespanha; 


Fig. 09 –  Cadiz – uma antiga cidade fenícia situada sobre o Atlântico e a sul de Portugal podia ser protegida, pela armada inglesa a partir de Gibraltar – posse inglesa desde 1703 – e a partir de 1812, após a decisiva batalha vencida de Trafalgar, travada, em 21 de outubro de 1805 frente a este porto,. Foi neste porto atlântico que se reuniram as CORTES de ESPANHA e que traçaram um novo capítulo da soberania espanhola. Ainda que esta constituição, fosse abolida em 1814, foi a base conceitual para a retomada do pacto nacional espanhol e com reflexos em Portugal após a Revolução do Porto e a constituição das Cortes Lusitanas
Por este meio alhanaraõ o caminho para uma uniaõ cordeal de ambas as naçoens; quando pelo contrario, a Hespanha se supporá livre, e Portugal conquistado e escravo; e esta idea só de persi será origem de dissensoens civis, que se podem agora acautellar mui facilmente; mas que para o futuro teraõ mui pouco remédio, que naõ seja a força, e a violência, meios sempre vitandos, quando póde haver outros de aquietar os povos”.
Este trono único, além dos instrumentos governamentais - como as cortes que existiam na Espanha e não em Portugal, o possível surgimento de um primeiro ministro - existia a uniformização das duas línguas. Uniformização de suas respectivas gramáticas, que apesar de suas proximidades, tinham abismo entre elas e indústrias gráficas e jornalísticas com gestação em estruturas comerciais ainda embrionárias.


Fig. 10 –  CARLOTA JOAQUINA
Além disto, no âmbito interno da nobreza espanhola e da lusitana existia uma diferença fundamental. Enquanto a espanhola era hereditária, na lusitana o título de nobreza desaparecia com a morte do se portador. De outra parte a compra dos títulos de nobreza lusitana era uma boa fonte de renda para a sua corte. O Brasil republicano vingou-se silenciosamente desta situação vexatória dando aos seus cães os títulos da nobreza.
Porém todos estes temas deviam dar lugar a grande discussão que, em abril de 1812, era a incógnita de um oficial da coroa britânico no comandando absoluto do exército lusitano e a serviço da corte refugiada no Rio de Janeiro. Apesar de parecer, hoje,  em abril de  2012, um índice bem periférico era índices das forças subterrâneas que se moviam silenciosamente em direção a um espaço novo e próprio. Espaço próprio e novo do qual seriam alijados,  não só a corte, mas todos os parasitos, as suas práticas corruptas e corruptoras passivas ou ativas. Parasitos intervenientes - por vontade própria e espúria - que se haviam apropriado e instalado em cargos e de funções do comando de quem constituía o PODER ORIGINÁRIO, de fato e de direito,  da Nação Brasileira.
Esta lição parece ultrapassar amplamente os limites da época dos fatos aqui considerados e das fronteiras nacionais em questão


Fig. 11 – RETIRADA do EXÉRCITO FRANCÊS em 1811 após a  Batalha de Sabugal

A fria e úmida Londres do inverno de 1812 era ainda um dos poucos  lugares da cultura ocidental na qual que o editor do Correio Braziliense, nº 047, em abril podia publicar no setor de Politica, p. 421 um decreto de uma dos reinos germânicos na voz d General Barão de Pommereul, Conselheiro de Estado, Diretor Geral das Imprensas e Livrarias de Hamburgo que publicava:
“O direito de publicar artigos sobre a política não pertence senão ao Governo. Em conseqüência todo jornal cientifico em que se permitir a sua inserção será sujeito a ser suprimido, e a outros procedimentos que se intentarão contra o editor e autor. Por outra parte encerrando-se estritamente na esfera das artes e das ciências, a que os seus jornais devem ser com sagrados, poderão contar com o favor e aprovação de um Governo sábio, que protege as ciências, e as artes verdadeiramente atem, e todo quanto tende a aperfeiçoá-las”. (sublinhado pelo blog)
Este silêncio imposto oficialmente por um governo dos mais liberais entre os demais reinos germânicos e que se gabava de “sábio e que protegia as ciências e as artes”, certamente mostram as dificuldades enfrentadas por um jornalista no início do século XIX, das dificuldades de separar as circunstâncias das artes e da ciência da política.
O exame destas dificuldades, duzentos depois, põe ainda mais relevo e escancara o abismo entre o PODER ORIGINÁRIO do GOVERNO de SUA NAÇÃO. O pior é que desta sementeira do mal permanece até os dias atuais. O tabu do tema da política permanece subliminar no inconsciente coletivo como pouco interessante, senão uma especulação aventurosa, vazia de sentido ou simplesmente mentirosa. Este abismo, este tabu e este afastamento intencional do povo - nas decisões políticas - cria corpo e maiores evidências, no evento da pretensão de DONA CARLOTA ser candidatar à Coroa Espanhola. Distância que se fará abismal por meio da teia política continental e exclusiva que as coroas européias impunham para preservar os seus próprios interesses hereditários e ganhos econômicos e de prestigio. Distância de SUA NAÇÃO que estas coroas diziam e faziam crer estarem representando à revelia do PODER ORIGINÁRIO do seu GOVERNO.



Fig. 12 –  Cadiz –  Foi neste porto que se reuniram as CORTES de ESPANHA e que traçaram um novo capítulo da soberania espanhola. Como afirmou o Correio Braziliense em abril de 1812 “Negar que a Nação Espanhola tira vantagens de sua instituição de Cortes he negar uma verdade mais clara que a luz do dia; porque se não fosse o entusiasmo que tem produzido em Espanha o chamamento das Cortes, e a esperança de um governo regular, nunca teria acontecido a resistência que se tem feito aos Franceses” Estes mesmos franceses estavam concentrando  o poder, de sua nação, e o colocando nas mãos de  uma única figura do poder central em Paris. Portugal estava longe de aprender esta lição. E quando as CORTES LUSAS conseguiram se reunir entre 1820-1822 foi muito depois da derrota francesa e já era tarde  para manter a unidade do Reino Luso

O evento reforça com mais um episódio de não estava no ar apenas “a vontade da troca das cores das fitinhas nas braçadeiras dos guardas da corte” e o que o “problema seria resolvido NO GRITO”. Haveria mais dez anos para um duro amadurecimento da deliberação e da decisão irrevogável da soberania nacional brasileira, diante de montanha de problemas e da qual a corte lusa era uma das mais contumazes e constantes contribuintes.


Fig. 13 –    Palácio das Necessidades - As CORTES LUSAS reunidas entre  e  1820 e 1822 após os movimentos populares da Cidade do Porto no dia 24 de Agosto de 1820 e muito após a derrota francesa e já era tarde  para manter a unidade do Reino Luso. Além de os delegados brasileiros serem amplamente hostilizados nestas cortes estava bem viva a memória da execução dos revoltosos de Lisboa sob as ordens do Marechal Beresford
Cresce a compreensão de que só a soberania nacional brasileira iria consolidar a autoridade legitima. Só as formas da delegação civilizadas, legais e contratualmente aceitas por todos deste PODER com ORIGEM, permite a eficiência no exercício desta mesma autoridade brasileira.  Autoridade cuja origem é de tal forma coerente, que seja possível o bem coletivo e moralmente orientado para onde é proveniente. A soberania brasileira começava, em 1812, a dispensar lentamente as espúrias mediações do poder.


FONTES

BICENTENÀRIOS das INDEPENDÊNCIAS na AMÉRICA do SUL

CARLOTA JOAQUINA

DOM JOÃO VI


CORTES de CADIZ de 1812

CORREIO BRAZILIENSE, nº 047, abril de 1812

GOYA : FAMILIA de CARLOS IV da ESPANHA

PORTUGAL - invasões francesas
PORTUGAL – A revolução do Porto do dia 24 de Agosto de 1820
PORTUGAL – Cortes de 1820 - 1822

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