quarta-feira, 24 de outubro de 2012

NÃO FOI no GRITO – 055





Os MORDOMOS de FAMÍLIAS dos RICOS ou a
 BUSCA dos CULPADOS de SEMPRE e de TUDO.

“...fazendo assim de todo o reyno de Sicilia uma só familia, debaixo de uma cabeça, governada pelas justas e liberaes leys que ella mesma formara. Estes melhoramentos porem na Constituição de Sicilia, naõ se tem feito sem encontrar uma forte opposiçaõ da parte dos interressados, como succede sempre que se propõem reformas para abusos antigos”.
Correio Braziliense, nº 53, outubro de 1812, p. 691.

Fig. 01 – O artista Marlon Brando interpreta O Poderoso Chefão (Godfather) num filme de Francis Copola mostra a corrupção do pátrio poder tomando e mediando o poder do estado ausente. Um frágil poder originário facilmente cai na heteronímia destes “Duces”, Fürhers”  quando as cultura ainda se alimenta da escravidão servil ou da fácil escravidão voluntária. Esta se exime de toda culpa e a sanção moral das mesmas as jogando nas costas de um pátrio poder mal entendido e ainda mais se é fomentado pela propaganda e pelo marketing.

Esta frase do Correio Braziliense de outubro de 1812 já pertence ao ideal romântico da época. Se alertava, um lado  em relação aos interesses contrariados, do outro lado, os dois séculos seguintes mostraram e desnudaram quem era de fato era esta “família” siciliana idealizada. Evidenciaram os métodos de que estes “interessados” contrariados eram capazes de lançar mão para se dissimular e manipular os “culpados de tudo”. Reis ou Imperadores, como os irmãos Bonaparte, ditadores de toda ordem como os “duces” ou “fürers”  ou eleitos pelo marketing e propaganda estavam de fato, e de direito, na heteronímia subliminar para eles. 

Isaac CRUIKSHANK - José Bonaparte e a sublevação espanhola gravura de 03.09.1808
Fig. 02 – José Bonaparte (1768-1844), irmão mais velho de Napoleão Bonaparte (1769-1821), cumpriu, a duras penas, o papel de mordomo deste e títere como imperador (1808-1813) da Espanha. Sem entender o poder originário espanhol, gostar dele ou não querer entende-lo, viu perpetrar atentados e massacres que o pintor Francisco Goya transformou em obras de arte. Estas constituem índices desta clivagem entre o poder autêntico e o poder simbólico de um simples factoide.  Na falta de um contrato público e um pacto nacional, o poder fluiu, arrasou e afogou este temerário que depois da queda do irmão se refugiou nos Estados Unidos e morreu em Florença.

Estas infelizes e desprevenidas vítimas de um povo são controladas e com limites muito mais estreitos do que a sua onipotência pessoal pode perceber ou mesmo se imaginar. Na sua ingênua heteronímia sobem ao palco público da História. Palco orquestrado e manipulado por imperceptíveis “pontos” para eles e para a multidão. Os que parecem lideres, no final da cena descobrem-se, ou não, como “mordomos da casa dos ricos”. Estes “pontos” foram, e continuam a ser,  pautados e manipulados por aqueles que conseguiram acumular, bens físicos, pessoas e bens simbólicos. No entanto contra todas as evidências vale a antiga norma ou desculpa de plantão que era o “mordomo é culpado de tudo” já que alguém deveria responder pelo mal feito.

Fig. 03 – O resultado de 1812,  o “reyno de Sicilia uma só família” levou o poder de retorno ao clã primitivo. Clã no qual o mais sagaz, o economicamente forte e o mais respeitado ou temido politicamente é quem faz as leis, as manda executar e julga pessoalmente conforme o seu interesse.  A imagem acima demonstra este poder paralelo de malfeitores e contraventores temerários e é de mafiosos presos e sendo julgados coletivamente, em 1901. Eles estabelecem seus próprios contratos, regulavam-se pela honra de sangue familiar e se julgavam o poder de fato e de direito. O resultado das condenações pelo Estado Italiano foi a pura e simples eliminação física de juízes.

Especificamente na história do poder na Sicília, entre 1812 até 2012, não é possível ocultar a história da máfia, das “famílias” e os mais refinados controles de poder que foi capaz de estabelecer na ilha e em outras tantas culturas que acumularam bens físicos, pessoas e bens simbólicos.
O ato de governar, o fazer executivo, seguir os constrangimentos das rígidas normas legais e as tensões inerentes à  tomada de decisões - com as mais variadas e contraditórias consequências – certamente não agrada a ninguém muito menos aqueles que se julgam ricos. O “Mal Estar das Civilizações” (Freud) acumula-se e toma formas agudas e incomodas nestes cargos e funções. Contudo tentam especialmente os despossuídos

Thomas ROWLANDON 1755-1827- gravura 1816
Fig. 04 – O artista inglês mostra a pestilência e a desolação que os emissários britânicos praticavam sobre povos indefesos e julgados como bárbaros e incultos. Tais faltas era mais do que um pretexto válido para devastar e se apropriar fisicamente destas partes do globo terrestre.  Na Europa esta apropriação e dominação de novos territórios  provocaram guerras internas na concorrência entre estes  estados nacionais para ver quem ocuparia mais terras e povos. Ocupação com objetivo de acumular matérias primas e territórios. Territórios nos quais também  podiam abrigar os excessos de sua próprias população desqualificada nos campos e sem lugar ou sem hábitos e habilidades para a linha de montagem das suas indústrias.  Evidente que para este serviço sujo necessitavam de “mordomos e culpados de tudo” quando algo não dava certo, havia resistências locais ou “trampa” fosse descoberta e denunciada.
Estes ricos tem a seu favor comprar e manter prepostos favoráveis às suas fortunas acumuladas os da mais variadas precedências, inclusive de alguns entre eles como aqueles em perigo de falirem. Esta manutenção do poder já havia sido anotada em 1821 por Hipólito José da Costa, quando ironizava um patriotismo que era praticado só quando era favorável:
“Ora aqui temos um bom exemplo, do patriotismo daquela classe de homens : toda a mudança he boa, em quanto pode favorecer os interesses da Aristocracia; cessa de ser boa, quando protege o bem publico, e torna a ser boa quando pôde, com o pretexto da administração da justiça, livrar esses mesmos indivíduos do que se suppoem vexame”
Correio Braziliense, nº 158, julho de 1812, p. 79.

Este talvez seja o lado mais perverso, dissimulado e silencioso efeito do capitalismo, dos herdeiros da aristocracia e daqueles que praticam a retenção e o acúmulo monetarista que deveria circular como todo e qualquer poder.

PALÁCIO de TOQUIO - Museu de Arte Contemporãnea - PARIS Le Monde 13.04.2012
Fig. 05 – Um happening contemporâneo encena - os mordomos da morte e os culpados que não podem se defender

O Brasil não escapou desta sina. Se examinarmos aqueles que se prestarmos atenção à origem destes que denominamos aqui de “mordomos de casa de ricos” podemos rastrear biografias das mais variadas. Isto sem falar de militares, clérigos, professores que se prestaram a este jogo.

 Morais, 1994 p.734
Fig. 06 – Uma das aprendizagens mais impactantes na vida particular de Assis Chateaubriand foi a sua função de mordomo na Família Lundgren em Recife.  Em compensação esta família teve nos Diários Associados  uma atenção permanente e dedicada  na propaganda e marketing de suas atividades empresarias e que se espalharam por todo território brasileiro. Na foto,  Assis com Helena Lundgren
.
O caso exemplar de Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello (1892-1968), mordomo dos Lundgren, proprietários das Casas Pernambucanas (Morais 1994, 49,50) [ http://pt.wikipedia.org/wiki/Pernambucanas ]. Assis aprendeu como mordomo e passou a acumular gente, empresas e fortunas. Com este acúmulo  passou a chantagear ricos e fazer e a desfazer governos, sem cair na contradição de fazer parte de um deles. No entanto como profundo admirador da cultura e hábitos ingleses atualizou a antiga norma ou desculpa de plantão que era o “mordomo é culpado de tudo” já que alguém deveria responder pelo bem e pelo mal feito.




Renan SANTOS - FLICKr em  04.06.2012
Fig. 07 – A longa vida intrauterina e o lento amadurecimento do ser humano pode fornecer-lhe ocasião e desculpa para o retorno para a Natureza, Estas indecisões não são dadas aos outros seres vivos e que necessitam aprender rapidamente a usar a sua própria sobrevivência e autonomia. além de providenciarem a sua reprodução,

Não só o ideal romântico da “família” siciliana foi desnudado pelos dois séculos seguintes mostrando as suas contradições e corrupções. Também o populismo, a escravidão voluntária e o recurso ao poder acumulado,  a espera do primeiro temerário, geraram novas formas de barbárie, monstruosidades e genocídios das quais a humanidade quer sair o mais rápido possível. Esta pressa, vergonha e constrangimento em admitir o seu passado leva ao fazer pelo fazer. Esta mecânica apressada, e sem alma, ignora que toda civilização é uma construção artificial e única. Esta naturalismo esquece criar, implementar e provar qualquer projeto digno deste nome. Não adianta dissimular e muito menos lançar mão e manipular “os mordomos como culpados de tudo”. Na direção contrária, desta entropia, é necessário transcender a Natureza dada, admitir e agir positivamente para levar adiante esta construção, numa atenção e trabalho continuados. Impõe-se o cultivo das condições para a prática de  rupturas epistêmicas, estéticas e de hábitos incoerentes com o aqui e o agora.

 FONTES BIBLIOGRÁFICAS
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro.   Porto Alegre – São Paulo : Globo e USP, 1975.  2v.

FOUCAULT, Michel.  Microfísica do poder. Rio de Janeiro : Graal, 1995. 295 p.

FREUD, Sigmund.(1858-1939).O mal estar na civilização (1930). Rio de Janeiro : Imago, 1974. pp. 66-150.  (Edição standard brasileira de obras psicológicas completas de Sigmund Freud, v.13)

MORAIS, Fernando, 1946 – Chatô : o rei do Brasil, a vida de Assis Chateaubriand. São Paulo ; Companhia das Letras, 1994, 735 p. http://pt.wikipedia.org/wiki/Assis_Chateaubriand

WRIGHT MILLS C. A elite do poder. 3.ed.  Rio  de Janeiro : ZAHAR, 1975.  421 p..

 FONTES NUMÈRICAS DIGITAIS
CASAS PERNAMBUCANAS

CORREIO BAZILIENSE – Londres - outubro de 1812

José BONAPARTE (1768-1844)

MÁFIA SICILIANA

ROWLANDON Thomas (1755-1827)

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