A ESCRAVIDÃO
SUBLIMINAR e SILENCIOSA.
Fig.
01 – A clássica imagem da Revolução Francesa
retratando as condições das três classes sociais onde a mais antiga e numerosa
serve de montaria e conduz as duas outras.
“Os abusos
do Governo da Sicília, e a decadência daquela nação, provinham pela maior
parte, da discontinuação de seu Parlamento, O do augmento progressivo do poder
da Coroa. Era logo necessário para cortar o mal pela raiz, fazer reviver aquelas
assembléas da nação, que sugeitando á discussão publica a conducta do Ministério,
estabelecem um freio eficaz á ambição dos que Governam, e á sua propenção ao
despotismo”.
Correio Braziliense, nº 52, setembro de 1812, p. 560.
George CRUIKSHANK
--1792-1878
Fig.
02 – O despotismo que se verticaliza e
centraliza é uma caraterística de todas as sociedades nas quais está em
jogo o PODER. Esta verticalização e
o centralismo conduzem a jogar toda a carga política, econômica e do trabalho
produtivo sob as costas de uma única classe. Esta é subjugada, manietada,
tornada inofensiva e, no final, sucumbe, sendo a ruína de toda a pirâmide que
se erguera sobre as suas costas.
O despotismo de uma
nação só torna-se viável na medida em que os cidadãos entregam ao déspota a sua
própria vontade. A retribuição e a. recompensa que este déspota confere, a quem
renuncia a sua própria vontade, é a segurança e o gozo de uma confortável heteronímia
de suas próprias vontades, reforçada
pela garantia que não haverá sanção para os seus atos. Os cidadãos descobrem
tarde que as aparentes vantagens recebidas, a falta de necessidade de prestar
contas dos seus atos, responde pelo feio nome de ESCRAVIDÃO. Por mais que
aumentem as vozes e produzam a maior algazarra, já é tarde e despotismo vai até
as suas últimas consequências.
A dimensão da escravidão
só é compreensível, e possui sentido, na medida em que consideramos e
possuirmos referenciais e o contraste da liberdade. Etimologicamente a liberdade (in Ferrater Mora 1984
verbete Liberdade) deriva da cerimônia publica promovida pela sociedade romana
quando um dos seus integrantes atingia a idade núbil e de reprodução. A pessoa
que atingia o estágio do “liber” liberdade era declarada oficialmente apta para
reproduzir mais membros da sociedade. No contrário o escravo era reproduzido e
não legava e nem os seus descendentes não pertenciam à sociedade romana.
Fig.
03 –- O pequeno Boney no Trono Imperial por George CRUIKSHANK --1792-1878 em gravura assinada de 12.10.1814. O
indivíduo, despreparado para lidar com a verticalização e o centralismo do exercício
do poder de um grupo, de uma nação ou religião,
assume e centra este exercício sobre si mesmo. É o culpado de tudo. De fato não aprendeu - ou esqueceu - que o
poder circula. No caso de um fracasso ele torna-se o bode expiatório coletivo,
não importando as causas da catástrofe. O suicídio destes indivíduos é
recorrente ao longo da História humana. Os que o seguiam até aquele ponto
percebem-se isentos de qualquer culpa ou sanção moral, pois “apenas estavam cumprindo ordens”.
O perigo não é a arma,
em si mesma e nem o porte de arma. O problema consiste em que é PORTADOR de UMA
ARMA. O porte de uma arma pode se concedida a quem se identifica com uma
sociedade equilibrada e para quem cultiva a plena cidadania. Na pós modernidade
esta identificação é possível realizar com uma pessoa que conscientemente se
identifica por meio dos seus dados pessoais fornecidos para esta mesma
sociedade. Esta possui o direito desta concessão deste porte de arma na medida
em que esta sociedade possui acesso imediato aos dados de um cidadão que se
identifica com os ideais que esta civilização possui e sobre os quais realiza
os contratos correntes com toda a
coletividade. Tornar PORTADOR de UMA ARMA a quem ainda não atingiu a liberdade
somática, moral ou individual, é uma evidente temeridade e um risco para esta
sociedade. Risco e temeridade, que terminam em tragédia, em geral. Esta
tragédia não terá sanção alguma se esta sociedade descobre tarde que esta
pessoa PORTADORA de UMA ARMA, não gozava de autonomia da sua vontade, da plena
liberdade ou de responsabilidade para responder por seus atos.
Fig.
04 – O indivíduo despreparado e temerário conduz a coletividade - que se reúne sob a sua liderança – para a
catástrofe da escravidão SUBLIMINAR
com a subtração SILENCIOSA da competência e o direito de deliberar e decidir.
A fama, a emoção e o entusiasmo são maus
conselheiros e são caminho como mostra a pintura
“Naufrágio de do Juan” (1840) de Eugênio Delacroix inspirada no drama de de Moliére. O líder está a beira de se tornar mais um bode
expiatório. A multidão, que o segue,
movida pela. s forças da propaganda, do pertencimento e do rebanho, descobre
tarde o engodo e é vitima de mais um naufrágio.
A preparação - das
cenas destes equívocos, tragédias e gestos - é silenciosa Quando os estampidos
soam, os gritos ferem os ares e o sangue corre,
já é tarde. Qualquer esforço é inútil e só agrava os efeitos. Em política,
arte e esporte não é possível pedir desculpas. O equívoco, a tragédia e o
sangue do passado, apenas irão servir de alerta contra o silêncio, a omissão e
os equívocos. No máximo pode constituir-se em alertas vindos de um passado
morto. Alertas para tornar a liberdade compreensível a todos e torná-la cheia
de sentido prático. Compreensão de sentido que se tornará prática corrente e
universal na medida em que se considera, se possui referenciais e capaz de
perceber e lidar com o contraste com aquilo que não é liberdade
Ilya Yelimovich REPIN
(1844-1930) – Detalhe “Os homens da Sirga no rio Volga”- c.1870 http://en.wikipedia.org/wiki/Ilya_Repin
Fig. 05 – O jovem
despertando para a escravidão eslava no meio do
trabalho,
numericamente gigantesco e condenado a puxar, pela sirga, o pesado barco do
Estado Russo. A vontade popular na heteronímia era forçada ao trabalho físico e
à adoração mental do Estado nacional. Este trabalho e esta adoração eram
montados e controlados pelo regime dos czares.
O exemplo concreto de pessoas deste passado
que cultivaram e praticaram a liberdade, constituem um grande patrimônio para
as escolhas de quem ainda pode fazê-las. Os problemas, em relação a estas
pessoas de um passado morto, iniciam com narrativas, em relação a elas, e que
no final derivam para a formação de um mito estranho tanto para o biografado,
como para quem recebe esta narrativa. Em segundo lugar não naturalizar o que
está fora da série normal de vidas. O terceiro é gerar uma narrativa fora do
repertório daqueles que estão ainda em condições de escolher entre a liberdade
e a escravidão.
eorge CRUIKSHANK --1792-1878
Fig.
06 – O medo da reforma social toma forma
na guilhotina com vida própria perseguindo os donos do poder político,
econômico, militar e religioso. O uso da imagem da guilhotina associa à Revolução
Francesa, ao Terror e ao domínio de um Razão, Esta imagem busca argumentos
visuais para desqualificar, neutralizar e congelar o Poder vindo da sua origem.
Como imagem evoca exemplos e argumentos que tem por objetivo bloquear qualquer
possibilidade de mudança política, econômica, militar e religiosa.
Entregar uma narrativa
mítica sobre a liberdade, a democracia ou ética para alguém incompetente, é o
mesmo do que entregar o porte de uma arma a um cidadão que não se identifica
com os ideais que esta civilização. Sem conhecimento e sem vontade manifesta e
pública, não há direito de ninguém presumir silenciosamente de que alguém
possuir e ter condições de realizar
contratos correntes com toda a
coletividade. Primordialmente a educação forma e escolar possui este papel e
este sentido. Quanto mais elaborada e complexa é uma sociedade, mais longa é
esta educação do indivíduo, que se candidata a pertencer a ela. Na atualidade
esta educação formal consome grande parte da vida de quem deseja realizar estes
contratos.
Fig.
07 – O consumo perdulário da produção
industrial conduz à escravidão
comandada sob o nome do deus Baco. A imagem foi criada em 1860 e deve-se Jorge CRUIKSHANG (1792-1878). O artista
cria uma metáfora visual onde massas populares embriagadas de consumidos
vorazes e sem limites. Este consumo desenfreado os aliena da sua própria
vontade transformam-se em seus escravos. Este usufruto imoderado e desproporcional -
daquilo que as máquinas produzem - gera
multidões cada vez maiores e cada vez mais alienadas de sua própria vontade e incapazes
de perceberem as suas próprias competências e limites. As mensagens da
propaganda e o marketing orientam e reforçam esta heteronímia subliminar e que
é sinônimo de escravidão.
Clique sobre a figura para ampliá-la.
A escravidão SUBLIMINAR e SILENCIOSA pode ser resumida em não possuir a
competência e o direito de deliberar e decidir. O pior acontece quando alguém
já possuía a liberdade e a vem perder. O pior pobre é aquele que alguma vez era
rico de fato ou se julgava como tal.
A escravidão voluntária
é impossível de contornar e evitar na medida em que se apagam referenciais e os
contrastes com a liberdade. A escravidão reproduz a escravidão. O escravo é
incapaz de retirar outro escravo da heteronímia de sua vontade. O escravo só
reproduz a sua condição. Não lega o “liber”
da reprodução da liberdade aos seus próprios descendentes. Estes apenas se
multiplicam numericamente numa sociedade de escravos que não deliberam e nem
decidem.
FONTES
BOÉTIE, Etienne La
(1530-1563). Discurso da
Servidão Voluntária (1549). Tradução de Laymert G. dos Santos. Comentários de Claude Lefort e Marilena
Chauí. São Paulo : Brasiliense, 1982.
239p.
CORREIO
BRAZILIENSE -Vol. IX nº 52 pp.405-568-
SETEMBRO de 1812
Etimologia da palavra Liberdade na edição
FERRATER MORA,
José –Diccionario de filosofia - Madrid : Alianza, 1981, 4v
LIBER na cultura romana:
Jorge CRUIKSHANG 1792-1878
CAMPANHAS
de NAPOLEÃO I – caricaturas de Jorge CRUISKSHANG 1792-1878
MOLIÉRE Jean-Baptiste POQUELIN (1622-1673) Don Juan (1665)
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