De JUNHO de 1812 até
JUNHO de-2012:
Os conflitos irreconciliáveis entre facções
afastam o
ideal de um Commonwealth lusitano.
Fig. 01 – O Império Britânico e as colônias estavam
em pleno desenvolvimento ao longo do
século XIX e atingiram o seu ápice
ao longo do reinado (1837-1901) da Rainha Vitória (1819-1901). O difícil e
demorado triunfo contra a França e os seus aliados, foi um aprendizado e um
impulso para esta expansão.
Em junho de 1812 a
Inglaterra estava sofrendo as consequências das barreiras do BLOQUEIO
CONTINENTAL EUROPEU imposto pelos franceses. Este bloqueio inviabilizava o
envio dos produtos da sua nascente era industrial britânica para esta região
geográfica.
Fig. 02 – O embarque para o Brasil em se deu no dia
29 de novembro de 1807. A esquadra estava sob o comando do Vice-Almirante
Manuel da Cunha Souto Maior.
Londres buscava outros mercados pra os seus
produtos industriais bloqueados. Os britânicos não desistiam de buscar pontos
frágeis nas linhas europeias do bloqueio imposto pelos franceses. Estes, com
dificuldades para dominar a península ibérica, assistiam crescer as manobras
militares britânicas em Portugal e Espanha. A Batalha de Trafalgar (21 de outubro de
1805) dera-se quase no litoral de Portugal e na frente da Cádiz espanhola.
Esta cidade espanhola tornou-se um baluarte para os ingleses e os nacionais
descontentes com as tropas napoleônicas manobrando em sucessivas campanhas nos
seus territórios. Os espanhóis reuniram as suas Cortes em Cádiz e ali
proclamaram uma nova constituição.
Fig. 03 – Na BATALHA de FUENTES d'OÑORO – entre 03 e 05 de
maio de 1811 - os 25.474 soldados britânicos,
12.030 portugueses e 500 guerrilheiros espanhóis, sob o comando do Tenente General Sir Arthur Wellesley, Duque de Wellington, enfrentaram
48.452 franceses. Estes tiveram 2.844 baixas, os ingleses 1.497 e os
portugueses 307 baixas.
As tropas francesas tornaram-se mais frágeis
devido a grande aposta que Napoleão estava construindo para dominar e vergar a
Rússia.
No interior de Portugal travavam-se lutas
entre lusos, com mentalidades alinhados
com os gauleses, contra os favoráveis aos britânicos. Estes haviam levado para
a Inglaterra uma verdadeira colônia lusitana e entre os quais se encontrava
Hipólito da Costa. Porém, entre estes refugiados, as relações não eram nada
pacíficas. Enquanto isto, em Portugal, também havia lusitanos a favor dos
gauleses, e que eram a razão e apoio aos
exércitos franceses estarem no país e que expulsar os seus reis.
Fig. 04 – Monumento em Cádiz na Espanha celebra a
reunião das Cortes Espanholas em 1812 e a proclamação de uma constituição.
O editor do Correio
Braziliense estava numa situação no mínimo delicada. Como refugiado devia o
máximo de respeito e acatamento para aqueles que o acolhiam. Os seus
compatriotas lusos o atacavam com jornais concorrentes que defendiam uma
política de vassalagem ao regime luso.
Entre estes lusos estavam se desenhando paradigmas distintos e que é
possível agrupar em três vertentes. Uma destas vertentes seguia a franca
vassalagem à antiga monarquia lusitana e um dos primeiros estados europeus. O
outro cogitava na pura e simples independência brasileira, o que agrava os
britânicos pelas poderosas influências que podiam exercer neste território, sem
prestarem contas a corte em Lisboa. Numa terceira vertente, Hipólito advogava
uma solução lusa contrária a fragmentação pela independência do Brasil faca a
habilidade, fleuma e projeto britânicos.
Fig. 05 – Hipólito Jose da Costa percebia no modelo do Império Britânico e as colônias uma
possibilidade para manter coeso as conquistas lusitanas dos últimos três
séculos. Neste contexto, a separação e a soberania brasileira, trariam
consequências semelhantes aquelas que a Inglaterra sofrera com a independência
dos Estados Unidos. Estes não só estavam ausentes, em junho de 1812, na luta
inglesa contra o bloqueio naval europeu, mas faziam exigências e ameaças pelos
maus tratos que os seus marinheiros sofriam nas mãos dos britânicos.
Trabalhava silenciosamente,
ao estilo britânico para construir algo semelhante ao Commonwealth para
manter unida a vasta herança lusitana. Evidente que os seus agentes não se
davam conta dos seus próprios caminhos em junho de 1812 e que o tempo, agora,
nos permitem vislumbrar e criar outra narrativa.
Porém quem mandava, de fato
e de direito em Portugal, entre 1807 até 1820, era Lord Berenford (1768-1854).
Este britânico impunha um estado de sítio e de guerra, não muito longe dos
métodos praticados pelos gauleses nas áreas das suas conquistas que julgavam
consolidadas. Ele enforcava os fracos líderes do desmoralizado exército luso
fieis ainda ao seu rei no Brasil. A obra de Francisco Goya mostra esta
atmosfera de dominação pura e simples imposta pelos franceses.
Fig. 06 – O Tenente General Sir Arthur Wellesley, Duque
de Wellington conduzia as tropas que operavam na Península Ibérica contra a
ocupação francesa. O triunfo mais alto de sua carreira militara aconteceu na
Batalha de Waterloo, em 18 de junho de 1815 quando colocou definitivamente um
ponto final para as pretensões de Napoleão Bonaparte.
Assim é possível ler, de
outra forma, aquilo que Hipólito da Costa expõe no texto. a seguir. Ali ele
expõe toda a sua própria humanidade e as raízes dos conflitos e das
desconfianças nascidas entre lusitanos depois de humilhados, de um lado pela
sua impotência diante das armas francesas e do outro pela ajuda interesseira
dos britânicos. Estes sabem se mostrar superiores na compreensão dos seus
objetivos e manutenção das raízes do seu “Commonwealth of
Nations” no nascedouro e retomado após perderem os Estado
Unidos. Aliás, Hipólito traduz e publica, neste mesmo número, uma firme
intervenção do governo norte-americano diante de humilhações sofrida pelos seus marinheiros em mãos britânicas.
Fig. 07 – Os uniformes de soldados franceses e suas armas são o resultado da era
industrial. A indústria bélica chegou ao se apogeu com as duas Guerras Mundiais
do século XX. Porém entre as guerras napoleônicas os exércitos de todas as
nações forneceram oportunidade para as linhas de montagem industriais e os
repetidos esforços coletivos da guerras regionais e internacionais e das quais
se perdeu a conta.
É possível ler o texto a
seguir como um véu que se levanta depois de dois séculos. Debaixo deste véu se
evidenciam os conflitos entre facções lusitanas irreconciliáveis. Certamente
estes conflitos mostram mais uma razão para a soberania do Brasil e tentar
recomeçar uma história livre desta cultura mesquinha, ainda com a aparência das
mais carinhosas e humanas possíveis.
CORREIO
BRAZILIENSE - JUNHO de 1812, nº
049, p. 781- 786.
Reflexoens sobre as novidades deste mez.
BRAZIL. Formação do novo Ministério.
No nosso numero passado annunciamos
o rumor, que se espalhou em Londres, de que o Exmº. Conde do Funchal, éra
chamado ao Rio de Janeiro para entrar no Ministério. Nos demos pouco credito
aquella asserçaõ; agora corre outro boato, de que o mesmo Conde do Funchal lhe
nomeado para capitaô General do Rio Grande do Sul; e por consequencia, será o
general em chefe para commandar o exercito na guerra contra Montevideo ; alguns
até pretendem que ja fez uniformes, comprou espada, &c. Nós damos ainda
menos credito a esta asserçaõ do que demos á primeira ; naõ só porque S. Exª.
nunca seguio a vida militar; mas porque, sabendo de alguns exemplos de
Governadores do Brazil, que fôram depois nomeados ministros diplomáticos naõ
nos lembramos de nenhum caso em que depois de ser ministro plenipotenciario se
fosse ser Governador ou Capitão General no Brazil. O Elle nao ter sido, nem
ser, militar, naõ he na verdade um obstáculo; porque muitos fidalgos tem obtido
o posto de Capitão General no Brazil, sem seguirem a vida militar; alem de que
bastaria que os seus apaniguados entrassem a espalhar, que elle sabia perfeitamente
os principios theoreticos da sciencia militar - e se alguém duvidar disso,
chama-se-lhe Satélite de Napoleaõ, revolucionário, &c.; e está a disputa
acabada.[...]
Fig. 08 – A emboscada de 02 de maio de 1808 numa
pintura de Francisco de GOYA (1746-1826) obra de 1814, óleo 266 x 345 cm-
Museu do Prado Madrid. Esta emboscada provocou uma brutal reação e os
fuzilamentos sumários que os exércitos franceses praticam na noite seguinte e
que Goya registrou no quando simétrico a este, além da numerosa série dos “Desastres da Guerra”.
O Conde do Funchal tem mostrado taes
poderes na administração dos productos dos monopólios Reaes (diamantes, páo
Brazil, urzella, e marfim) que até naõ tem querido cumprir ordens que lhe
vieram, para entregar estas administraçoes aos agentes que o Banco do
Rio-de-Janeiro nomeou, como ja mostramos.
Deixemos pois de parte ao Exmº.
Conde do Funchal, concedemos lhe que he muito honrado, e naõ he capaz de abusar
dos dinheiros e sommas considerabilissimas que lhe passam pelas maõs ; que he o
mais intelligente homem nas vendas dos diamantes, no manejo da lapidação destas
pedras preciosas; que entende do estado do mercado, para fazer as compras e
vendas, que se fazem em Inglaterra por conta da Fazenda Real do Rio de Janeiro:
em fim concedamos a este Ministro todas as boas qualidades e requisitos
necessários para dezempenhar estes fins: mesmo que lhe naõ falte nenhuma; em
Uma palavra, supponhamollo uma emanação taõ pura, que até naõ sejam preciso nenhuns
exames ou trabalhos no Rio-de-Janeiro, para verificar as suas contas, nem ainda
depois d'elle morto.
Fig. 09 – A retirada os exército francês do solo lusitano, em abril de 1811,
coincide com os grandes preparativos da fracassada invasão da Rússia e para
onde Napoleão levou 400.000 soldados.
Ora ¿quem nos pôde assegurar que seu successor, ha
de ter as mesmas boas qualidades? Nós sabemos que um fidalgo Portuguez, que naõ
ha muitos annos estava de Embaixador em Roma, vendeo ali a prata do serviço da
Embaixada, que era d'El Rey e naõ sua, para jogar; que outro fidalgo pouco
depois embaixador em Vienna, contrahio dividas enormes, com o jogo e
desperdício, e que se aplicou para as pagar o dinheiro que se devia empregar em
cousas mais úteis. E portanto quem nos diz * que o suecessor do Conde de
Funchal, que vem manejar a Londres os mais importantes e avultados ramos das
rendas publicas do Brazil; naõ seja um homem do mesmo character ?
Mas diraõ, que ha de ser mui bom;
bem escolhido: seja ¿e se esse successor morrer, o seu secretario, que ficando
de Encarregado de Negócios necessariamente exercita os mesmos poderes, ha de
também ser outro anjo? A nós prece-nos que três anjos assim de seguida naõ se
encontram todos os dias neste nosso mundo peccador.
0 systema pois de Finanças, de
mandar o Governo do Brazil vender a Inglaterra os productos de seus monopólios,
por sua própria conta ; e comprar, também por sua conta, aqui os gêneros que
precisa, he uni systema naõ só susceptivel de abusos inaveriguaveis, mas
sugeito a graves inconvenientes.[...]
Fig. 10 – A frota britânica estava
livre de agir pelos mares afora,. depois da Batalha de Trafalgar em 21
de outubro de 1805, frente ao porto de Cádiz, Esta frota dará proteção à frota
lusitana que irá trazer a família Real Portuguesa ao Brasil.
Tomemos portanto a questão, neste
ponto de vista; é deixemos de parte a probidade dos agentes; que naõ he passar
por pouco. Demos o caso, que o Governo do Rio-de-Janeiro manda uma porção de
diamantes para que se venda; e se empregue o producto, em brim para velas de
navio, e se lhe remetta para o Brazil. Estaõ em Londres, ao tempo que chegam os
diamantes, negociantes da Turquia, da Rússia, e da Hollanda, para os comprar; e
os agentes venderam-nos aos negociantes da Turquia ¿como hade o Governo do Brazil saber; se os
negociantes de Rússia, ou de Hollanda; pagariam ou naõ pagariam melhor que os
da Turquia, no caso de que os diamantes lhes fossem offerecidos ? [...]
Daqui pois concluimos, que o systema
de finanças do Brazil, mandando vender por sua conta a Londres (pela maneira
que o faz) os productos mais importantes de seus monopólios, que constituem
parte das rendas publicas, he um systema muito ináor e quando se põem debaixo
da inspecçaõ do Ministro Diplomático, que rsside em Londres,he péssimo.
Mas ¿que se ha de fazer neste caso ? precisa-se
vender estes productos; e precisa-se comprar certos gêneros.
Façam-se essas transacçoens no
Rio-de-Janeiro ; depois de se publicarem em Londres, em Lisboa; e ainda em
outras capitães consideráveis de ambos os hemispherios ; e todas as precauçoens
do Governo naõ teraõ que dirigir-se, senaõ ao único ponto de que se arrematem
sempre os gêneros em hasta publica, ao que melhor partido fizer ao Governo; e
naõ ao que peitar occultamente o Secretario de Estado, ou o Thesoureiro mor, ou
Escrivão. Este o remédio mais obvio.
Se o Governo no Rio-de-Janeiro
precisa Breu para os arsenais ; ponha a lanços, quem lhe manda buscar tantos
barris de breu, dentro em tanto tempo, e a tal preço. O negociante que offerecer
o breu por menor preço, e dentro do tempo conveniente, deverá ter a
preferencia. Um negociante o mandará buscar a Londres, outro ao Baltico, outro
a Nova-York ; cada um segundo o estado de suas conrespoudencias, e
intelligencia mercantil; o mais habilidoso ganhará mais; e o Governo obterá o
gênero pelo menor preço possivel.
He verdade que o gênero comprado em
Londres he mais barato do que comprado no Rio-de-Janeiro; mas o Governo do
Brazil há de calcular, as despezas da condução e agencias, juncto com os
inconvenientes e imposiçoens que temos lembrado acima.
Esta razaõ de que se manda vender o
marfim a Londres; porque da mais dinheiro; e se manda comprar em Inglaterra o
brim porque he mais barato que no Rio-de-Janeiro, nos faz lembrar a historia do
barbeiro d'Almada.
Havia na Almada um barbeiro que
fazia a barba aos freguezes por dez reis, quando os outros em Lisboa levaram um
vintém. Certo economista de Lisboa assentou, que devia ir todos os sabbados a
Almada fazer a barba, para poupar dez reis ; mas como pagava um vintém de
passage ; vinha-lhe a sàhir cada barba por 30 reis, em vez do vintém que pagava
em Lisboa; até que um dia voltou-se o barco da passage com um tufaõ de vento ;
e o economista perdeo o chapeo, e a cabeleira, e o capote; podendo escapar-se a
nado: desenganou-se entaõ, que naõ éra economia ir fazer a barba a Almada.
Todos
bons Economistas observam, que o Governo, naõ deve ser negociante, nem ainda no
seu mesmo paiz ; porque, alem de outros inconvenientes, ha o grande embaraço de
naõ poder o Governo saber nem entender dos complicados arranjos, que produzem
as vantagens, ou desvantagens das especulaçoens mercantis ; ora ¿quanto maior deve ser este embaraço,
fazendo-se este commercio em um paiz tao distante daquelle em que o Governo
reside ?
Certamente para os ingleses, e os seus aliados, estava
muito vivo na memória movimento da soberania das mais ricas colônias americanas
e cujo movimento de soberania valeu-se do pretexto do controle, dos impostos e da
venda do chá realizados pela coroa britânica. Assim, em junho de 1812, os
negócio britânicos estavam da iniciativa das mãos particulares dos seus
súditos. Isto permitia ao governo britânico ocupar-se em tempo integral e como
todas as energias das questões da dilatação e consolidação do que viria tomar a
forma do seu exitoso“Commonwealth of Nations”.
Concluímos portanto, que estes rumores da mudança
do Conde do Funchal, devem fazer lembrar a S. Exa.,e aos outros, que promoveram
o systema de que elle, era Londres, fosse o Agente Commercial, ou inspector
destes fundos públicos ; a grande necessidade que há de por em melhor pé estes
ramos da administracçao publica, c-stabelecendo- se em principios geraes; e naõ
estribando-se na baze de que este ou aquelle ministro he próprio para estes ou
qucües negócios ; porque o homem pôde morrer, ou ser mudado; e o systema he só
quem fica permanente.
Fig. 11 – O triunfo de dom João IV celebrado
na noite de 06 de fevereiro de 1818, recebeu um cenário de Jean Baptiste
Debret, um dos membros da Missão Artística Francesa. Estes artistas haviam servido
na corte de Napoleão Bonaparte. Num leitura semiótica é possível identificar
muito símbolos comuns aos dois monarcas. No entanto é gritante a cena seguinte
e que mostra sobre quem e sobre que trabalho se construía esta glória
A política do governo
britânico encarregou-se de eliminar o comércio escravagista. Não por razões
humanitárias, mas para erradicar a concorrência do trabalho braçal da era
agrícola e substituí-lo gradativamente pelo trabalho das máquinas de era
industrial. A Inglaterra liderava esta revolução industrial. Os britânicos
previam o fornecimento, não só os produtos de suas máquinas, mas o fornecimento
das próprias máquinas, que ela fabricava
Fig. 12 – A cena das crianças cativas num navio de
comercio de escravos é um contraste gritante da cena anterior. Esta
foto, de cerca do ano de 1840, mostra
sobre quem e sobre que trabalho se construía esta glória.
Tractado de Commercio.
A p. 746 deste n°. damos a lista dos
vasos Portuguezes, que tem sido tomados pelos Inglezes, em conseqüência de
fazerem o commercio de escravatura nas costa d'Africa. Os defensores do
tractado entre a Corte do Brazil e Inglaterra teraõ a bondade de nos explicar,
em que consiste a habilidade do Negociador Braziliense quanto a segurar-se da
execução das estipulaçoens da parte de Inglaterra ; e se com effeito aquelle
commercio ficou prohibido pelo tractado; como justificam o Governo no Brazil em
dar licença a estes vasos a hir fazer um commercio prohibido, no qual se
arriscam a serem tomados pelos navios armados Inglezes. O tractado acha-se no
Correio Braziliense, vol.v.p. 273 ; e exaqui o extracto que lhe diz respeito.
" Artigo X.—S. A. R. o Principe
Regente de Portugal, estando plenamente convencido da injustiça e má politica
do commercio de escravos, e da grande desvantagem, que nasce da necessidade de
introduzir e continuamente renovar uma estranha e factícia população, para
entreter o trabalho, e industria nos seus dominios do Sul da America, tem resolvido
de cooperar com S. M. Britanniica, na causa da humanidade e justiça, adoptando
os mais efficazes meios para conseguir em toda a extensão de seus domínio suma
gradual abolição do commercio de escravos. E movido por
este principio S. A. R. o Principe Regente de Portugal, se obriga a que aos
seus vassallos naõ será permittido continuar o commercio de escravos, em outra
alguma parte da costa d'Africa, que naõ pertença actualmente aos domínios de S.
A. R. nos quaes este commercio foi ja discontiuuado, e abandonado pelas
Potencias e Estados da Europa, que antigamente ali commerciávam; reservando com
tudo para os seus próprios vassallos o direito de comprar e negociar em
escravos nos dominios Africanos da Coroa de Portugal. Deve porém ficar distinctamente
entendido, que as estipulaçoens do presente artigo naõ seraõ consideradas, como
invalidando ou aftectando de modo algum os direitos da coroa de Portugal aos
territórios de Cabinda, e Molembo (os quaes direitos fôram em outro tempo
disputados pelo Governo de França) nem como limitando ou restringindo o
commercio de Ajuda, e outros portos de África (situados sobre a costa commummente
chamada na lingua Portugueza a Costa da Mina) e que pertencem ou a que tem
pertençoens a Coroa de Portugal; estando S. A. R. o Principe Regente de
Portugal resolvido a naõ resignar nem deixar perder as suas justas e legitimas
pertençoens aos mesmos, nem os direitos de seus vassallos de negociar com estes
lugares, exactamente pela mesma maneira, que elles até aqui o practicavam."
O pano de fundo destas questões é um tema importante a
ser observado, estudado e socializado. Trata-se das origens da era industrial e
da mentalidade que lhe dava suporte teórico e político. De outra parte trata-se
do ocaso da cultura da CONTRA REFORMA que foi o cerne da cultura ibérica entre
os anos de 1500 e1800 e da qual a cultura brasileira é herdeira direta. Do
outro lado a cultura da REFORMA dava suporte e apostava nas potencialidades da
era industrial e na mentalidade necessária para a sua constituição e expansão
plena. Esta cultura da REFORMA era diferente das culturas castelhanas e lusas que se haviam aliado à CONTRA REFORMA
desde os primeiros momentos e aplicava os seus instrumentos da PROPAGANDA da FÈ
e o temido SANTO OFÍCIO. Hipólito foi vitima do ultimo e agora estava e
trabalhava numa cultura que era da REFORMA. A Inglaterra não havia adotado a
Propaganda da Fé nem conheceu os rituais, os tribunais e cárceres do Santo
Ofício.
Fig. 13 – Usos e costumes em Portugal em 1820 Viva
a diferenças entre a herança dos
costumes da corte, os trajes britânicos e ao herança francesa.
Em junho de 1812 Espanha e Portugal estavam sendo
garroteados pelos seguidores do Iluminismo francês, pela Razão e pelos
exércitos napoleónicos. A Inglaterra não assistia passiva a cena. Mantinha e
mobilizava, calculadamente, exércitos nacionais para cujo mando indicava oficiais e que tomavam as redes de
uma guerrilha continuada contra os franceses. A legitimidade desta presença
britânica vinha de velhos tratados comerciais assinados séculos antes destes
acontecimentos de junho de 1812.
Mas algo de novo e superior estava brotando para além
da REFORMA x CONTRA REFORMA em todas as mentes e corações. Mentes e corações, cansados
da cultura que se queria universal e que se mantinha pelos saques constantes aos
cinco continentes. Cansados do maniqueísmo da cultura europeia de três séculos.
Cultura que se manteve a ferro e fogo de guerras continuadas ou pelos processos
e cárceres da Santa Inquisição ou em nome de um pseudo Livre Arbítrio. Culturas
que se desenvolveram no continente europeu e se abasteciam pelos seus
respectivos sistemas coloniais e com consequências cuja trágica contabilidade
de mortes, sofrimentos de toda ordem não tiveram uma contabilidade neutra e
científica.
Esta situação gerava desdobramentos muito mais complexos
e que escapam a percepção dos agentes de junho de 1812. Desdobramentos que
ainda fogem , em junho de 2012, da maioria das narrativas que constam nos
manuais da História Universal.
CORREIO BRAZILIENSE – ARMAZEM LITERÁRIO
NAVIO
de ESCRAVOS
D. Domingos Antônio
de Sousa Coutinho, primeiro e único Conde
de Funchal
www.estudosibericos.com 9 Ano III, Nº13, Juiz de Fora, março - junho/2010
www.estudosibericos.com/arquivos/iberica13/conde-de-funchal.pdfSimilares
GOMES, Ângela de Castro (org). A escrita de si e a escrita da História,Rio de Janeiro, FGV,2004.p.20
GONTIJO, Rebeca. História, cultura, política e
sociabilidade intelectual. In: SOIHET, Rachel et
alii(org). Culturas políticas e outros ensaios de história cultural. História
política e ensino de
história.Rio de Janeiro, Mauad, 2005. p. 267.
D. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho foi
Conselho de S. M. F, sargento-mor dos Dragões de Chaves, Coronel de Cavalaria
na praça Almeida, Governador e Capitão-general dos Reinos de Angola e de
Benguela, embaixador em Madrid, entre outros.
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