A
HISTÓRIA do GRITO.
Para entender a gênese e
a história da construção do quadro e pintura “O GRITO do IPIRANGA”, e o seu
contexto, é necessário entender o final do Império Brasileiro e sua passagem
para o regime republicano, a partir de São Paulo.
Fig.01 - MELLO Pedro Américo de
Figueiredo 1943-1905 - Grito do IPIRANGA -1888 - óleo 415 x
760 cm - Museu Ipiranga São Paulo
O tema do “GRITO do
IPIRANGA” ganhou a sua dimensão nacional inconteste, graças à liderança e pela
potência emergente da Província de São Paulo ao final do regime imperial
brasileiro. A potência e a liderança nacional, estavam sendo disputadas ativamente
por duas concepções políticas e sociais antagônicas no âmbito desta Província
Imperial. As lideranças, das duas concepções antagônicas, estavam lastreadas em
solidas bases econômicas. Os Barões do Café do Vale do Paraíba estavam numa
base. Eles sustentavam regime imperial com seus títulos e que recebiam
evidentemente os afagos deste regime. Noutro base, o mesmo café criava fortunas
no interior do estado onde ele chegava na época, inclusive nas profundezas da
mesma província, em rápida expansão em novas fronteiras agrícolas. A expansão
do café, em novas fronteiras agrícolas, estava nas mãos de proprietários sem
títulos imperiais e com um projeto republicano muito bem definido para a
conquista do poder. Estes novos ricos não gozavam os afagos do regime imperial.
O seu projeto de hegemonia era amparado por um paradigma integro e integral no
qual o regime imperial deveria ser sumariamente eliminado e esquecido. O poder
nacional era único e indivisível.
02 - A CONVENÇÃO
de ITU, em 1873, realizada por
proprietários do interior paulista e sem títulos imperiais e com um projeto
republicano muito bem definido para a conquista do poder
Ambos os lados não
entraram em confrontos diretos e abertos uns contra os outros. Os que defendiam
e dependiam do regime imperial preferiram as armas culturais, simbólicas e
estéticas para mostrar a sua superioridade. Os republicanos concentraram-se na ação política através do
GRÊMIOS REPUBLICANOS que se multiplicaram em todos os recantos inclusive na
capital do Província como na faculdade de Direto do Largo de São Francisco.
03 - FIGUEIREDO Aurélio 1854-1916 - Último
Baile do Imperio na Ilha Fiscal-1889 pintura de 1905 – Pinacoteca do Estado do Amazonas
Evidente que esta
mensagem foi captada e entendida pelos Barões do Café. Trataram de garantir e
prolongar, o mais possível, o regime imperial que os afagava. Nada melhor do
que buscar, no interior desta província, índices da constituição e manutenção
deste regime. Certamente os testemunhos diretos do evento ocorrido, no dia 07
de setembro de 1822, à margens do Riacho Ipiranga, não existiam mais e como
também não deixaram uma documentação abundante e inquestionável. Tanto melhor.
O mito podia ser criado e fantasia historicista correr solta que interessava
para os defensores e beneficiários de regime imperial. Pensaram em um museu e
obras de arte que tornaria carne e sangue do regime politico cujo projeto
desejam materializar e defender. Agiram ao melhor estilo do Imperador Napoleão
I, seguiram os passos da Missão Artística Francesa no Brasil e a tipologia da
Villa Médici. Nada melhor do que um pintor brasileiro Pedro Américo, radicado
em Florença e do arquiteto Italiano Tomaso Gaudenzio BEZZI. Este apresentou um
projeto em 1882 e que ganhou forma definitiva no ano seguinte, enquanto foi
hospede do Barão do Rio Branco.
04 – Museu do Ipiranga projeto definitivo
em 1884 por Tomaso Gaudenzio BEZZI e
construído por Luigi PUCCI recebeu a pintura do Grito do Ipiranga concluído em
1888 por Pedro Américo
Se de um lado o GRITO do
IPIRANGA não foi o ato mais importante dos diversos processos da construção da
soberania brasileira, do outro ele deu imagem e consistência narrativa popular
para a unidade nacional. No processo da
conquista da soberania nacional o GRITO do IPIRANGA foi pouco determinante.
Esta soberania foi construída num longo e penoso trabalho desenvolvido em
muitos outros momentos. As decepções, contratempos de um governo colonial
obsoleto e concentrador.
O papel da Província de São
Paulo foi predominante ao gerar o interesse na construção e na manutenção
de uma versão da História a partir do ponto de vista paulistano. Tanto a
História Paulista como a europeia impõe uma lógica civilizatória. Na Europa o
naufrágio do governo de Napoleão III, diante do fracasso das armas germânicas
de Bismark e da Comuna de Paris, abriu espaço para o 3º retorno do regime da Republica na França. Esta mesma França
demorou um século para deliberar e decidir que a “Tomada da Bastilha” era o instante simbólico - entre milhares de outros eventos - da sua
Grande Revolução. Assim, quando nenhum testemunho estivesse vivo, os franceses
escolheram o “14
de julho” como festa nacional, no dia 06 de julho de 1880, e quando também fixaram, e adotaram, a divisa "Liberté,
Égalité, Fraternité"
como
oficial. Uma série de
países sul-americanos, nesta mesma década, fixou e passou a celebrar eventos,
erguer monumentos e realizar quadros históricos
em relação á a conquista da sua soberania. Evidente que elas
correspondem e podem ser acompanhadas por uma onda de historicismo
arquitetônicos, do mobiliário e moda no que foi conhecido com “espirito
de fim do século” XIX, no interior do qual buscavam eventos para exibir
amostras desta mentalidade.
05 - A pintura do Grito
do Ipiranga, concluída em 1888, por Pedro Américo, exposta á visitação publica
no Museu do Ipiranga.
Nada mais justo que a
província de São Paulo - que mantinha um fluxo constante com a cultura europeia
- seguisse este espírito e com ele dialogasse de uma forma contínua e
consistente. O quadro O GRITO do IPIRANGA de Pedro Américo pode ser uma destas
manifestações desta tendência.
Na Europa, a “Belle
Epoque”, o espirito do fim do século e início do novo silenciaram com os
canhões e as misérias das trincheiras de 1914. Enquanto isto, o estado de São
Paulo levou a sua hegemonia política até 1929, graças ao café. O final desta
hegemonia sobreveio com a Quebra de Bolsa de Nova Iorque, a Revolução de 1930 e
se tornou definitivo em 1932. Ao canalizarem as energias da Revolta
Constitucionalista de 1932 para a Universidade de São Paulo (USP), tiveram o
amparo simbólico, cultural e financeiro para continuar, inclusive, manter e administrar o Museu do Ipiranga.
Fig.06 - MELLO
Pedro Américo de Figueiredo 1943-1905 PAZ e CONCORDIA 1895 - esboço
Pinacoteca de São Paulo
Evidente que a USP tinha
profundas raízes culturais, jurídicas e simbólicas republicanas na gloriosa
Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Local de formação jurídica dos
líderes republicanos sul-rio-grandenses.
O exemplo mais
contundente veio do pintor do quadro que assumiu, não só a postura republicana,
mas tornou-se constituinte do novo regime como representante do Estado da
Paraíba. Porém manteve-se distante da doutrina positivista que ele já havia
contornado na sua tese[1]
do doutorado, defendida em 1867, num reduto positivista da Universidade Livre
de Bruxelas.
[1] MELO Pedro Américo de Figueiredo A Ciência e os sistemas :
questões de história e de filosofia natural. João Pessoa : Editora
Universitária, 2001, 143 p
Fig.07 - MELLO Pedro Américo de
Figueiredo 1943-1905 - PAZ e CONCORDIA – 1902 - óleo 300 x 431 cm - Itamaraty RJ
A história do quadro GRITO do IPIRANGA está intimamente associada à história da
Província de São Paulo. No contexto desta Província as duas coerentes
antagônicas se complementam e constroem símbolos nacionais que transcendem o
final do Império Brasileiro e são consagrados ao longo da passagem para o regime
republicano. O quadro “GRITO do IPIRANGA, carrega o máximo de conteúdo no mínimo de sua construção material, como é
da natureza de toda autêntica obra de arte. Este máximo inclui o universo
simbólico do seu contexto do final do Império Brasileiro e sua passagem para o
regime republicano brasileiro a partir de São Paulo.
Fig.08 - MELLO Pedro Américo de
Figueiredo 1943-1905 - PAZ e CONCORDIA – 1902 - óleo
detalhe – Palácio Itamaraty - RJ
O gigantesco universo simbólico, das duas concepções
antagônicas e dos quais se perderam os ecos, legou à cultura brasileira um dos
sentidos fundamentais da soberania brasileira. Quando o regime republicano
paulista conquistou o poder estadual, fomentou o mito do bandeirante como um
ente integrador do Brasil profundo. Os seus agentes estavam projetando a sua recente conquista do solo do interior
paulistano. Ao mesmo tempo evidenciavam as economias acumuladas com o café. A potencialidade
deste investimento de capitais paulistas no imenso território nacional tinha
como objetivo primeiro os retornos financeiros garantidos e multiplicados. Para
este objetivo funcionaram a contento, tanto o mito do “GRITO”, como o do
“BANDEIRANTE”, e com frutos para além do
aguardado tanto para São Paulo como para o Brasil.
Fig.08 - ALMEIDA
JUNIOR, José Ferraz de (1850-1899) “Partida da Monção” - 1897 - estudo óleo 74 x 119 cm - Pinacoteca de São
Paulo – uma das imagens do Mito do Bandeirante criado no início do regime
republicano por um pintor proveniente do interior do estado e que expressa o
projeto de uma nova elite paulista e sem títulos nobiliárquicos.
FONTES
BIBLIOGRÀFICAS
ABREU, Regina. A fabricação do Imortal: Memória,
História e Estratégias de consagração no Brasil. Rio de Janeiro :
Rocco, 1996. 235p
BARATA, Mário
«Século XIX: transição e início do século XX» in ZANINI, Walter. História geral da arte no Brasil. São Paulo
: W.M. Salles, 1983. pp.377-451.
CARVALHO, José Murilo. A formação das almas: o imaginário da
República. São Paulo: Companhia das
Letras. 1990.
FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves.
(Org.). O Brasil Republicano: O tempo do
liberalismo excludente: da Proclamação da República à Revolução de 1930.
v.1 Rio de Janeiro: Civilização Brasiliense, 2003.
CHAVES de MELO. Gladston. Origem,
formação e aspectos da cultura brasileira.
Rio de Janeiro : Padrão , 1974.
277p.
CUNHA, Luiz Antônio,
Universidade temporã : o ensino superior da Colônia à Era Vargas. Rio de Janeiro : Civilização
Brasileira. 1980, 295p.
MELO , Pedro Américo
de Figueiredo (1843-1905) A Ciência e os sistemas : questões de
história e de filosofia natural. João Pessoa : Editora Universitária, 2001, 143
p
SOUZA NEVES, Carlos de. Ensino superior no Brasil. Rio de Janeiro : MEC-INEP 4v. 1969.
SOUZA CAMPOS, Ernesto. Educação Superior no Brasil: esboço de
um quadro histórico de 1549-1939. Rio
de Janeiro: Ministério de Educação, 1940. 611p.
____. História da Universidade de
São Paulo. São Paulo : USP, 1954. 582p
WRIGHT
MILLS C. A elite
do poder. 3.ed. Rio de Janeiro : ZAHAR, 1975. 421p.
FONTES
NUMÈRICAS DIGITÀIS
BARÔES do CAFÉ
BARÕES do IMPÉRIO
PRP
MUSEU IPIRANGA
http://pt.wikipedia.org/wiki/Museu_do_Ipiranga
http://pt.wikipedia.org/wiki/Museu_do_Ipiranga
PROJETO
de Tomaso Gaudenzio BEZZI e obra de Luigi PUCCI
USP –
Faculdade de Direito
PEDRO AMÉRICO
Repercussões
do quadro “Batalha do Avahi” de Pedro Américo
O GRITO
O mito do bandeirante
Paulo
Setúbal
A III
REPÚBLICA na FRANÇA
Este material
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histórica. ...
1º blog :
SUMÀRIO do 1º ANO de postagens
do blog NÃO FOI no GRITO
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